segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Terry Gilliam fala sobre a morte de Heath Ledger

O cineasta Terry Gilliam deu uma entrevista à Folha na última quinta-feira, durante o Festival de Cinema de Toronto, onde seu filme, "The Imaginarium of Dr. Parnassus", foi exibido.

FOLHA - O sr. parece o mais não-americano dos diretores americanos, no sentido de que foge a convenções seguidas pela maior parte de seus pares.

GILLIAM - Não é meu plano, é por acaso. No caso de "Parnassus", por exemplo, pensei só no começo do filme, uma carruagem antiga com uma trupe exibindo um espetáculo antigo, ao qual ninguém presta atenção, uma forma de arte completamente ignorada. Aos poucos, a coisa toda cresce.

Eu gostaria de fazer um filme com efeitos especiais incríveis, como os outros diretores, mas não tenho dinheiro, então eu limito os momentos em que isso acontece no filme. Como? Em "Parnassus", você tem de passar por um espelho mágico e só quando está lá dentro as coisas são fantásticas. Assim eu controlo o orçamento. Dentro do espelho, efeitos especiais; fora do espelho, realidade. Mas só isso seria chato, então resolvemos complicar um pouco a trama. Aí entrou a questão da livre escolha, que permeia o filme, entre Parnassus e seu rival.

FOLHA - Quão difícil é ser o sr. nessa indústria?

GILLIAM - Eu não tenho escolha, então só sou. Vivo na Inglaterra há 42 anos e não perdi meu sotaque norte-americano, ou seja, fui formado em algum momento assim e assim fiquei. Mas não sou otimista em relação à indústria. Hoje, você só pode fazer um filme com orçamento de US$ 200 milhões ou de US$ 2 milhões. Não há nada no meio-termo, e eu estou no meio-termo, meus filmes custam entre US$ 20 milhões e US$ 40 milhões. "Parnassus" custou US$ 30 milhões.

É como no resto da sociedade americana nos últimos anos: os ricos ficaram mais ricos, os pobres, mais pobres, e a classe média está sendo varrida do mapa. Os filmes que atualmente são feitos refletem isso, de uma maneira estranha. O que me aborrece, porque é significativo da atmosfera para o cinema hoje em dia. Imagine: eu tinha o próximo filme de Heath Ledger depois de ele fazer o Coringa em "Batman - O Cavaleiro das Trevas", que todo o mundo sabia que seria um dos maiores sucessos de todos os tempos, e ainda assim ninguém me dava dinheiro! É uma loucura.

FOLHA - É uma sensação ambígua ver o filme pronto sem o ator principal por perto?

GILLIAM - Ah, sim... Eu adoraria ver o filme que planejei fazer com ele. É o mesmo filme, poucas coisas mudaram depois da morte dele, quer dizer, além da óbvia grande mudança. Ele me disse que gostaria de ver o filme pronto, eu gostaria que ele visse também, nenhum de nós teve o desejo realizado.

FOLHA - Em uma das cenas, feitas já depois da morte dele, o personagem encontra barquinhos com as fotos da Princesa Diana e dos atores Rudolph Valentino e James Dean, numa referência aos que morreram jovens e no auge. O sr. acha que Heath Ledger foi vítima da cultura de celebridades atual?

GILLIAM - Não, Heath era muito centrado. Eu não sei o que aconteceu exatamente, ou ele tomou muitas pílulas para tentar dormir, acordou e esqueceu que já tinha tomado, sei lá, mas todas as histórias que cercam sua morte são bobagens. Não havia neurose nele, e isso é que torna tudo trágico.

FOLHA - De onde veio o personagem que ele interpreta, Tony Liar (Tony Mentiroso)?

GILLIAM - Ah, ele é escorregadio, não é? Tudo começou com [o ex-primeiro-ministro britânico] Tony Blair. Ele foi tão escorregadio, empolgado e bom de convencer as pessoas das coisas mais ridículas, como a Guerra do Iraque. Quer dizer, uma coisa era o presidente Bush mentir a respeito, mas Blair era um sujeito basicamente decente. Ele me intriga.

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